Discriminação Contra Pessoas com Deficiência: Desafios e Luta
- Beatriz S. Nascimento
- 2 de mar.
- 4 min de leitura

A discriminação contra pessoas com deficiência física e albinismo continua a ser um grande desafio em Angola, como relatado por várias vítimas e reforçado por especialistas em questões sociais. Segundo o sociólogo Óscar Lourenço, há uma tendência histórica de exclusão e desprezo para com essas pessoas, o que acentua as barreiras sociais. Emília da Costa, uma estudante com albinismo, partilhou o sofrimento que viveu durante a infância, quando enfrentou o preconceito no ensino primário devido ao tom da sua pele. “Quando eu era pequena, no ensino primário, não era difícil perceber o preconceito. As outras crianças tinham preconceito comigo, porque muitas delas não tinham contacto com pessoas com albinismo nas suas famílias, o que gerava um ciclo de discriminação”, relatou Emília, que destacou a importância da intervenção de professores, que ajudaram a diminuir essas barreiras no ambiente escolar.
Apesar de os tempos escolares terem melhorado, Emília admitiu que, na vida adulta, as dificuldades ainda persistem, especialmente devido à curiosidade de alguns homens que se aproximam de mulheres com albinismo. “Existem homens que querem se relacionar com mulheres albinas por curiosidade”, afirmou, destacando que, embora a discriminação tenha diminuído, a situação ainda não está completamente resolvida. Ela também mencionou a dificuldade financeira enfrentada por muitos indivíduos com albinismo, que têm de arcar com o custo elevado dos produtos de proteção solar essenciais para evitar danos à pele. “Esses produtos são caros. Um protetor solar pode custar até 35 mil Kwanzas, o que é inacessível para muitos que têm dificuldades financeiras”, disse, sublinhando, no entanto, o esforço do Governo que tem feito doações para ajudar a suprir algumas dessas necessidades.
A Experiência de Eugênia Alfredo: Superando a Discriminação de Forma Contínua
Além de Emília da Costa, Eugênia Alfredo, uma mulher de 32 anos e mãe de seis filhos, também compartilhou a sua experiência de discriminação. Aos cinco anos, Eugênia sofreu um acidente com uma mina tradicional, o que resultou em uma deficiência física permanente em seu pé esquerdo. Vendedora no mercado de Matabicho, na cidade do Sumbe, Eugênia já foi chamada de “aleijada” e “perna de boi” nas ruas. “Muitas vezes já fui discriminada na rua, as pessoas olham para mim de forma estranha devido à minha condição física. É difícil, mas temos de superar e seguir em frente”, disse Eugênia, que reconhece que, embora a discriminação tenha diminuído, ainda sente vergonha em alguns momentos quando vai à rua, devido à forma como pode ser tratada.
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Compromisso Governamental e Ações para Reduzir a Discriminação
Em relação a esses problemas sociais, Cândida dos Santos, diretora do Gabinete provincial da Acção Social, Família e Igualdade do Género, reiterou o compromisso do Governo Provincial do Cuanza-Sul em combater a discriminação, promovendo políticas inclusivas que beneficiem especialmente as mulheres e outros grupos vulneráveis. Ela afirmou que, apesar dos progressos, ainda existem vários desafios a serem superados. Cândida também destacou a importância de datas como o Dia Internacional da Discriminação Zero para relembrar a necessidade de igualdade e inclusão, além de abrir um diálogo mais amplo sobre os direitos daqueles que historicamente têm sido marginalizados.
A questão da inclusão também foi abordada por Eduardo Manuel, diretor provincial da Associação Nacional de Cegos e Amblíopes de Angola (ANCAA) no Cuanza-Sul. Ele defendeu a realização de acções formativas para pessoas com deficiência visual, a fim de garantir que possam se locomover com maior independência e autonomia. “A locomoção com a bengala branca exige algumas técnicas, como, por exemplo, subir e descer de um determinado lugar e como evitar obstáculos. Todos estes elementos carecem de uma revisão por parte das pessoas com deficiência visual”, explicou Eduardo, que enfatizou a importância dessas formações para a autonomia das pessoas com deficiência visual, permitindo-lhes realizar atividades do cotidiano de forma mais independente.
Consequências Psicológicas da Discriminação e o Papel da Educação
A discriminação, como afirmou o psicólogo clínico Anselmo Victor, pode ter consequências graves para a saúde mental das vítimas, levando ao isolamento e até à depressão pós-traumática. Ele alertou para o impacto negativo que a discriminação pode ter no desenvolvimento pessoal e profissional de indivíduos, muitas vezes afetando suas decisões e bem-estar. Pessoas com doenças crónicas, como HIV/SIDA, por exemplo, podem optar por abandonar o tratamento ou recorrer à automedicação devido ao estigma social associado à sua condição. Esse comportamento prejudicial é um reflexo direto da discriminação que enfrentam na sociedade.
Por sua vez, a professora Nelsa Mateus sublinhou a importância de refletir sobre a discriminação e de educar as futuras gerações para criar uma sociedade mais solidária e harmoniosa. “É na educação do homem que devemos trabalhar para reduzirmos os atos de discriminação. Independentemente da pessoa ser ou não religiosa, é importante que ela seja humana”, afirmou, destacando a necessidade de promover valores de aceitação e respeito desde a infância.
Ação Legal Contra a Discriminação: O Papel da Constituição
Em resposta a esses desafios, o advogado Mário Albano encorajou as vítimas de discriminação a utilizarem os mecanismos legais disponíveis para proteger seus direitos. “Devem dirigir-se às instituições de direito, como o Serviço de Investigação Criminal (SIC), Procuradoria Geral da República (PGR) e os tribunais, pois esses atos são considerados crimes públicos ou semipúblicos”, afirmou. Ele reiterou que a Constituição da República de Angola garante a dignidade da pessoa humana, rejeitando qualquer forma de discriminação, seja ela baseada na raça, etnia, sexo, ou qualquer outra característica.
Mário Albano também destacou que a Constituição assegura a igualdade de todos perante a lei e o direito de todos os cidadãos a gozar dos direitos e liberdades fundamentais. “É o princípio da universalidade, todos os angolanos, incluindo os cidadãos estrangeiros residentes em Angola, devem ter como fundamento de proteção o princípio da dignidade da pessoa humana”, concluiu, enfatizando a importância de se garantir a igualdade de direitos e a eliminação de todas as formas de discriminação.
Em suma, embora tenham sido feitos progressos significativos na luta contra a discriminação em Angola, ainda há muito a ser feito para garantir que todas as pessoas, independentemente de sua condição física, racial ou social, possam viver em uma sociedade inclusiva e justa. A educação, a sensibilização e a ação legal são fundamentais para reduzir as barreiras que ainda persistem e promover uma convivência mais harmoniosa e igualitária.
B.N.
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